sábado, 4 de dezembro de 2010

Egito Gonçalves








EIS O QUE ME DISSERAM


Os campos dão pedras, as vinhas estiolam,
as aldeias dão párias emigrando em porões.

Não deixes para amanhã o que podes fazer hoje;
não deixes para amanhã o quebrar do silêncio,
meter o foice no trigo sazonado,
carregar no botão, soltar a tempestade.

Quebra a solidão com o sol matinal
que aponta a claridade sobre as frondes.

As cidades dão fumo, queimam a amizade,
esmagam a consciência, distribuem o crepúsculo.

Um pequeno descuido, nova fuga de tempo,
o espelho transforma-te em velhice - perderás a vida,
pálido, encolhido, no fundo das caves.

É mais tarde do que pensas !
É difícil agora deste fruto ácido
conseguir raízes, flores e perfume.

Não deixes para amanhã o grito necessário,
o enforcamento sumário do agente opressor,
o tributo para a máquina de alargar horizontes ...

Eis o que me disseram !

Egito Gonçalves
(1922-2001)
in "Sonhar a Terra Livre e Insubmissa"
de Fevereiro de 1973.

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