quarta-feira, 28 de maio de 2014

SIM, É VERDADE, NÃO TENHO MOTIVO


Sim, é verdade, não tenho motivo
para esta tristeza, o desalnto
que logo de manhã em mim acorda
com o abrir da janela e a certeza

de que outro dia igual em vão começa.
O sol, a chuva, a névoa, sempre o tédio
dos passos repetidos tudo aplaina.
O trabalho repugna, a arte enjoa

mastigada sem fome. Que fastio
por tudo! Mas não sei porquê, se o amor,
a esperança, resistiram ao pó do tempo,

secretos e intactos ao desgaste.
Que anemia soluça no meu sangue?
Dou-lhe o nome de exílio. Há quantos anos!...

João José Cochofel
(1919-1982)
In "Quatro Andamentos"
Vértice
Coimbra-1966.


segunda-feira, 26 de maio de 2014

LAMENTAÇÃO


Os outros
foram-se embora.

Eu fiquei só
e deixaram-me.

Deixara-me
e não voltaram.
Deixaram-me
e fiquei só.

Fiquei só com esta angústia
que me deixaram...

João José Cochofel
(1919-1982)
In "Descoberta"
Coimbra Editora
(1945)

INDÍCIOS DE PRIMAVERA


Como exprimir
esta incerteza,
esta ansiedade,
esta tristeza vaga, indefinida,
a que nem sequer conheço bem as causas?!...

Ouvem-se galos ao longe
e a brisa mal se sente
na atmosfera parada.
O sol declinando doura tudo,
e a tarde vai descendo
calma e deliciosa....
À minha volta tudo é silêncio,
apenas cortado pelo latir dos cães,
e o cantar dos galos longínquos
e o barulho do comboio que passa ao fundo.

Tudo é calmo e sereno...
até mesmo o meu desespêro
que me põe lágrimas nos olhos...

João José Cochofel
(1919-1982)
In "Descoberta"
Coimbra Editora (1945)


ÁLCOOL.

Partir
sim, mas partir realmente,
definitivamente,
cobra que deixa a pela já crestada dos sóis
e se empoleira nas árvores como um pássaro

Partir
que os hotéis de luxo têm seus quartos guardados para mim,
e os salões embandeirados de luz
esperam-me
Partir para Jungfraus e Niagaras,
e à noite embriagar-me entre cristais e mulheres!

Depois,
raspar com as unhas no chão e enterrar-me,
deixando os olhos de fora
para que neles poise
o último orvalho da manhã.

João José Cochofel
(1919-1982)

domingo, 25 de maio de 2014

CANTO DÉCIMO TERCEIRO


De criança sempre gostei de canas
e roubava-as do rio
ainda verdes.
Deixava-as depois estendidas ao sol durante todo o verão
e recolhia-as, ligeiras,
como o sussurro dos mosquitos. 



Quando no inverno
os ossos estalavam de frio
e os gatos tossiam sobre o damasqueiro
corria até ao sótão
e metia as mãos no meio das canas quentes
ainda com todo aquele sol em cima.


Tonino Guerra
(1920-2012)
In "O Mel"
Trad. de Mário Riu de Oliveira. 
PAÍS


Teus olhos são de onde
nenhuma neve manchou
a luz, e entre as palmas
a aragem
é invisível de clara.

Teu desejo é de onde
nos corpos se alia
o animal com a graça
secreta
de olhar e sorriso.

Teu existir é de onde
recebe o pensamento,
pela areia de mares
amigos,
a eternidade em tempo.

Luís Cernuda
(1902-1963)
In "Mesa de Amigos"
Trad. de Pedro da Silveira.

sábado, 24 de maio de 2014


E SE DEPOIS DE TANTAS PALAVRAS

E se depois de tantas palavras,
não sobrevive a palavra!
Se depois das asas dos pássaros,
não sobrevive o pássaro parado!
Mais valeria, na verdade,
que coma tudo e acabemos!

Ter nascido para viver na nossa morte!
Levantar-se do céu rumo à terra
por seus próprios desastres
e espiar o momento de apagar com a sua sombra as suas trevas!
Mas valeria, francamente,
que comam tudo e tanto faz!…

E se depois de tanta história, sucumbirmos,
não já na eternidade,
mas dessas coisas simples, como estar
em casa ou pôr-se a matutar!
E se em seguida descobrirmos,
subitamente, que vivemos,
a avaliar pela altura dos astros,
pelo pente e as nódoas do lenço!
Mais valeria, na verdade,
que comam tudo, sem dúvida!

Dir-se-á que temos
num dos olhos muita pena
e também no outro muita pena
e nos dois, quando olham, muita pena…
Então… Claro!… Então… nem uma só palavra!


César Vallejo
(1892-1938)
Trad. de José Bento.
FAZ FALTA SER CEGO

Faz falta ser cego,
ter como metidas nos olhos raspaduras de vidros,
cal viva,
areia a ferver,
para não ver a luz que salta em nossos actos,
que ilumina por dentro a nossa língua,
a nossa palavra quotidiana.

Faz falta querer morrer sem lápide de glória e alegria,
sem participação nos hinos futuros,
sem lembrança nos homens que julguem o passado sombrio da Terra.

Faz falta querer já na vida ser passado,
obstáculo sangrento,
coisa morta, esquecimento seco.


Rafael Alberti,
(1902-1999)
Trad. de José Bento

 in " Antologia da Poesia Espanhola Contemporânea"

O SALTO


Somos como um cavalo sem memória,
somos como um cavalo
que não se lembra já
da última vala que saltou.

Vimos correndo e correndo
por uma longa pista de séculos e obstáculos.
De quando em quando, a morte...
o salto!

e nimguém sabe quantas
vezes já saltamos
para chegar aqui, nem quantas ainda saltaremos
para chegar a Deus que está sentado
no final da corrida...
à nossa spera.

Choramos e corremos,
caímos e giramos,
vamos de tombo em tumba,
dando pulos e voltas entre cueiros e mortalhas.

León Felipe
(1884-1968)
Trad. de José Bento.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

OS DOIS IRMÃOS

Um foi prisioneiro na Alemanha
e há trinta anos olha fixamente o pão
como se tivesse a fome de outrora.
O outro fez a guerra em África
e a água no copo contempla-a
com a sede do deserto.
Hoje fechados em casa
não querem ver ninguém.
Dormem de costas voltadas
com o rosto afundado no travesseiro
da grande cama.
Às vezes saem de noite
por estradas largas e vazias
como a Lua e a Terra no céu
um atrás do outro
não se sabe para onde.

Tonino GUERRA
(1920-2012)
Trad. de Mário Rui de Oliveira.

terça-feira, 20 de maio de 2014

OS ABANDONADOS PELA MORTE.


Um com um punho apoiado na cara,
o outro com a cabeça afundada nas mãos
e o terceiro com os olh0s abertos para o vazio
os três velhos dormitam ao redor da mesa, na esplanada de um bar.
Depois do café, acalorados, esperam a desconhecida
que nos sonhos os visita, pacientes ou impacientes,
e acaricia as máscaras dos seus rostos,
que o suor desenha e apaga.
De súbito, o ruído de uma moto
e um par jovem e enlaçado atravessa a estrada,
depois o estrondo, os previsíveis sinais da morte
que procura a juventude e não os corpos decrépitos.
Os três velhos olham-se e choram o seu abandono.

Juan Luis Panero
(1942-2013)
In "Poemas"
Trad. de Joaquim Manuel Magalhães.





segunda-feira, 19 de maio de 2014


 O HOMEM INVISÍVEL.
 
 
Olha-se ao espelho que já não o reflecte,
tudo, menos ele, aparece na fria superfície,
o quarto, móveis e quadros, a variável luz do dia.
Assim aprende, com terror silencioso, a ver-se
não nos gestos teatrais - ainda traços humanos - da morte,
mas nos dias de depois, no vazio do nada.
Inútil fechar os olhos, estúpido quebrar o espelho obstinado,
procurar outro mais fiel ou mais amável.
É ele só, o homem invisível, o que desaparece,
é só ele, um rasto apagado,
que não contempla ninguém, porque é ninguém,
o nada no vidro indiferente da vida.


Juan Luis Panero
(1942-2013)
In "Poemas"
Trad. de Joaquim Manuel Magalhães
A MEMÓRIA E A MORTE

Só são tuas - na verdade - a memória e a morte,
a memória que apaga e desfigura
e a sombra da morte que aguarda.
Só lembranças fantasmais e o nada
repartem entre si a herança sem destino.
Depois de contratos sórdidos,mentiras,
de gestos inoportunos e palavras
- irreais palavras ilusórias -,
só um testamento de cinza
que o vento move,espalha e desordena.

Juan Luis Panero
(1942-2013)
"in Rosa do Mundo 2001 Poemas para o futuro"
Trd. de José Bento
E DE SÚBITO ANOITECE.

Viver é ver morrer, envelhecer é isso,
enjoativo, tenaz cheiro da morte,
enquanto repetes, inutilmente, umas palavras,
cascas secas, vidro partido.
Ver morrer aos outros, àqueles,
poucos, a quem verdadeiramente amaste,
desmoronados, desfeitos, como o fim deste cigarro,
rostos e gestos, imagens queimadas, enrugado papel.
E ver-te morrer a ti também,
remexendo frias cinzas, apagados perfis,
disformes sonhos, turva memória.
Viver é ver morrer e é frágil a matéria
e tudo se sabia e não havia engano,
mas carne e sangue, misterioso fluir,
querem perseverar, afirmar o impossível.
Copo vazio, trémulo pulso, cinzeiro sujo,
na luz nublada do entardecer.
Viver é morrer, nada se aprende,
tudo é um desapiedado sentimento,
anos, palavras, peles, despedaçada ternura,
calor gelado da morte.
Viver é ver morrer, nada nos protege,
nada teve o seu ontem, nada o seu amanhã,
e de súbito anoitece.

Juan Luis Panero
(1942-2013)
In "Poemas"
Trad. de Joaquim Manuel Magalhães.

EPITÁFIO DIANTE UM ESPELHO


Dura há-de ser para ti a vida
que tuas crenças sacrificaste a uma estranha honradez,
para ti cuja única certeza é tua lembrança
e, por isso, teu sepulcro mais aziago.
Dura há-de ser a vida, quando os anos passarem
e por fim destruírem a pátria sonhadora da tua adolescência,
quando vires, como hoje, este fantasma
que anteriormente te consolou com sua formosura.
Quando o amor, como um vestido roto.
não possa proteger tua tristeza
e um motivo de zombaria, piedade ou assombro,
para os olhos mais puros seja apenas.
Duro há-de ser para o teu corpo ver morrer o desejo,
a juventude, tudo o que foste,
e procurar sem paixão o teu repouso
na surda ternura do que é débil,
na grísea destruição que alguma vez amaste.
«É a lei da vida», dizem velhos estéreis,
«e nada senão Deus pode mudá-lo» repetem,
sob a luz da noite, lentas sombras inúteis.
Dura há-de ser a vida, tu que amaste o mundo
que com um olhar ou uma suave carícia sonhaste possuí-lo,
quando a absurda farsa que tão bem conheces
não estiver já enfeitada com o efémero e belo.
Dura há-de ser a vida até àquele instante
em que veles tua memória neste espelho:
teus frios lábios não terão já refúgio
e em tuas mãos vazias abraçarás a morte.

Juan Luis Panero
(1942-2013)
 In "Antologia da Poesia Espanhola Contemporânea"
(T
radução de José Bento)

domingo, 18 de maio de 2014

POR VEZES, MUITO RARAMENTE.


Quando pouco na vida nos consola
do tempo, esse verdugo indiferente,
por vezes, muito raramente, na monotonia da noite,
entre repetidos sonhos, surge uma imagem
que reflecte o desejo que deixamos aí
e um rosto - a sua remota aparência - reconstrói
um intenso instantâneo da felicidade.
Quando tão misterioso privilégio nos chega,
acordar em seguida é viver o inferno:
não aquele jogo grotesco de chamas e demónios,
mas o demónio da luz de novo,
o fogo do primeiro cigarro.

Juan Luis Panero
(1942-2013)
Trad. de Joaquim Manuel Magalhães.
COM OS MORTOS

Os que amei, onde estão? Idos, dispersos,
arrastados no giro dos tufões,
Levados, como em sonho, entre visões,
Na fuga, no ruir dos universos…

E eu mesmo, com os pés também imersos
Na corrente e à mercê dos turbilhões,
Só vejo espuma lívida, em cachões,
E entre ela, aqui e ali, vultos submersos…

Mas se paro um momento, se consigo
Fechar os olhos, sinto-os a meu lado
De novo, esses que amei vivem comigo,

Vejo-os, ouço-os e ouvem-me também,
Juntos no antigo amor, no amor sagrado,
Na comunhão ideal do eterno Bem.

Antero de Quental
(1842-1891)
SONETOS DO REGRESSO

I

Volto contigo à terra da ilusão,
mas o lar de meus pais levou-o vento
e se levou a pedra dos umbrais
o resto é esquecimento:
Procurar o amor neste deserto
onde tudo me ensina a viver só
e a água do teu nome se desfaz
em silabas de pó
é procurar a morte apenas,
o perfume daquelas
longínquas açucenas
abertas sobre o mundo como estrelas:
Despenhar no meu sono de criança
inutilmente a chuva da lembrança.

Carlos de OLIVEIRA
(1921-1981)
SONETO INGLÊS.

Com o silêncio do punhal num peito,
O silêncio do sangue a converter
Em fio breve o coração desfeito
Que nas pedras acaba de morrer,

Vive em mim o teu nome, tão perfeito
Que mais ninguém o pode conhecer!
É a morte que vivo e não aceito;
É a vida que espero não perder.

Viver a vida e não viver a morte;
Procurar noutros olhos a medida,
Vencer o tempo, dominar a sorte,
Atraiçoar a morte com a vida!

Depois morrer de coração aberto
E no sangue o teu nome já liberto...

Alexandre O'Neill
(1924-1986)

sexta-feira, 16 de maio de 2014

INVENÇÃO.

Se invento a tua justa densidade.
Se invento o claro-escuro dos teus olhos.
Se invento uma raiz, um fruto,
um peso alegre e brando para os teus braços.
É porque vi um dia o teu perfil exacto
num templo de alegria e de saudade.

João Rui de Sousa

segunda-feira, 5 de maio de 2014

VOZ

Era uma voz que doía
Mas ensinava.
Descobria
Mal o seu timbre se ouvia
No silêncio que escutava.

Paraísos, não havia.
Purgatórios, não mostrava.
Limbos, sim, é que dizia
Que os sentia,
Pesados de covardia
Lá na terra onde morava.

E morava neste mundo
Aquela voz.
Morava mesmo no fundo
Dum poço dentro de nós.

Miguel TORGA
(1907-1995)
PROTESTO

Desespero da vida, crime turvo
Como o de água de rio que não corre;
Traição de bicho, arrependido e curvo
Dentro da concha onde se abisma e morre.

Cegueira negra no areal batido
Por altas e divinas claridades;
Pinheiro seco no pinhal, erguido
Como fantasma vil doutras idades.

Desespero da vida! Cobardia
Do tripulante duma embarcação
Que leva sonho, céu e maresia
Nas velas, no convés e no porão!

Miguel TORGA
(1907-1995)
In "Líricas Portuguesas"
( 2ª série Selecção, prefácio e notas de Cabral do Nascimento)
Outubro de 1945.

domingo, 4 de maio de 2014

POETA

Lembras-te, Mãe

do menino que perdeste
e que ficou...
do menino que ficou
mas que fugiu...?

Anda agora pela vida...

É o poeta dos olhos molhados
do sorriso triste
dos dedos longos...

Anda agora pela vida...

E um dia, Mãe
ele há-de voltar
novamente,
para lhe aqueceres as mãos frias
e chorar com ele as ilusões perdidas.

Entretanto
deixa-o sofrer mais algum tempo...

João José Cochofel
(1919-1982)
In "Descoberta"
Coimbra Editora
(1945)

sexta-feira, 2 de maio de 2014

CAIXAS E SACOS

Quanto maior é a caixa, mais leva.
As caixas vazias levam tanto como as cabeças vazias.
Muitas caixinhas vazias que se deitam numa grande caixa vazia,
enchem-na toda.
Uma caixa meio-vazia diz: “Ponham-me mais.”
Uma caixa bastante grande pode conter o mundo.
Os elefantes precisam de grandes caixas para guardar uma dúzia de
lenços de assoar para elefantes.

As pulgas dobram os seus lencinhos e arrumam-nos com cuidado
em caixas de lenços para pulgas.
Os sacos encostam-se uns aos outros e as caixas levantam-se
independentes.
As caixas são quadradas e têm cantos, ou então são redondas
e têm círculos.
Pode empilhar-se caixa sobre caixa até que tudo venha abaixo.
Empilhe caixa sobre caixa, e a caixa do fundo dirá: “Queira notar que tudo repousa sobre mim.”
Empilhe caixa sobre mim, e a que está em cima perguntará: “É capaz de me dizer qual de nós cai para mais longe quando caímos todas?”
As pessoas-caixas vão à procura de caixas e as pessoas-sacos à procura de sacos.

Carl Sandburg
(1878-1967)
Trad. de Alexandre O'Neill
In "Rosa do Mundo 2001 Poemas Para o Futuro"

quinta-feira, 1 de maio de 2014

NÃO CHORES.

Não chores, pois ainda tens
o vento e a distância.

O amor é o vento. Sem solução,
o abismo surge no teu olhar.

É certo que me turvas a garganta
com o teu pranto e a tua mão distante.

Não chores ainda: do ar bebes
o aroma da tristeza nas minha mãos.

Antonio Gamoneda.
REVELAÇÃO


Deixai o meu sangue correr para um outro sol
e pó cobrir os meus olhos
e uma nova crença surgir...

Há muito que morreu o mundo dos homens
e o reino de Deus nunca nos foi revelado
e a carne é efémera, e o ódio eterno.

Deixai o meu sangue correr para um outro sol,
porque a minha paz está numa outra terra
onde o sangue não é a hóstia
nem cada sorriso sangue e pedra

Tomaz Kim
(1915-1967)

MIOPIA

Sempre que vejo
o que os meus olhos não queriam
ver
(mas que sabem ser verdade)
É sempre este doer.
Como se a minha sensibilidade
estivesse toda no olhar e ver.
Como se a minha revelação
apenas viesse inteira,
para além da fronteira
do que os meus olhos dão.

Sempre que vejo...
Porque me dói assim?
Porque se desprende em mim
essa mágoa-essência
de surpresa retardada?

A minha consciência
está míope e cansada.

Fernanda BOTELHO
(1926-2007)
LUZ

A mesurável condição humana,
quanto me exige! Quanto proclama
o seu poder em mim!

Tal submissão nem me redime
nem me liquida.
Não é renúncia sublime
nem carícia retribuída.

Não tenho eira nem beira,
vivo nas dobras da terra
e aceito quanto me dão.

Eis o meu nome: toupeira.
- E o meu olhar se descerra
apenas na escuridão.

Fernanda BOTELHO
(1926-2007)