sexta-feira, 27 de maio de 2011

Luis Cernuda


NÃO DIZIA PALAVRAS


Não dizia palavras,
Aproximava apenas um corpo interrogante,
Porque ignorava que o desejo é uma pergunta
Cuja resposta não existe,
Uma folha cujo ramo não existe,
Um mundo cujo céu não existe.


Entre os ossos a angústia abre caminho,
Ergue-se pelas veias
Até abrir na pele
Jorros de sonho
Feitos carne interrogando as nuvens.


Um contacto ao passar,
Um fugidio olhar no meio das sombras,
Bastam para que o corpo se abra em dois,
Ávido de receber em si mesmo
Outro corpo que sonhe;
Metade e metade, sonho e sonho, carne e carne,
Iguais em figura, iguais em amor, iguais em
desejo.


Embora seja só uma esperança,
Porque o desejo é uma pergunta cuja resposta
ninguém sabe.

Luis Cernuda
(1902-1963)
In "Antologia da Poesia Espanhola Contemporânea"
Trad. de José Bento.

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