SONAMBULISMO
Tombam os dias inúteis:
amanhece, é tarde, anoitece.
Mas a nós que nos importa
ser manhã, meio dia ou noite?!...
Sonâmbula a vida decorre
- nas ruas, a paz larvar dos grandes cemitérios:
dentro de nós, cada um
apodrece.
Enchem-se de títulos vibrantes os jornais
- mas tudo é tão longe...
Passam homens por homens e não se conhecem:
Boa tarde! Bom dia!
Cada um fechado nas suas fronteiras,
os gestos vazios
a vida sem sentido
- sonambulismo apenas.
Acorda!
Ainda que seja só para o sobressalto,
que as ilusões do sonho se desfaçam
e as esperanças morram todas nessa hora!
Acorda!
ainda que o caminho a percorrer te espante
e o peso da obra a realizar te esmague!
Ainda que acordar seja
morrer depois aos poucos, em cada momento,
dolorosamente.
Joaquim Namorado
(1914-1986)
In "Líricas Portuguesas"
3ª série (Novembro de 1958)
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Há 21 horas
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