CASEBRE
Foi a estiagem
E o silêncio depois
Nem sinal de planta
nem restos de árvore
no cenário ressequido da planície.
O casebre apenas
de pedra solta
e uma lembrança aflitiva
O tecto de palha
levou-o
a fúria do sueste.
Sem batentes
as portas e as janelas
ficaram escancaradas
para aquela desolação.
Foi a estiagem que passou.
Nesses tempos
não tem descanso
a padiola mortuária da regedoria.
Levou primeiro
o corpo mirrado da mulher
com o filho nu ao lado
de barriga inchada
que se diria
que foi de fartura que morreu.
O homem depois
com os olhos parados
abertos ainda.
Tão silenciosa a tragédia das secas nestas ilhas!
Nem gritos nem alarme
— somente o jeito passivo de morrer!
No quintal do casebre
três pedras juntas
três pedras queimadas
que há muito não serviram.
E o arco do ferro do menino
com a vareta ainda presa.
Jorge Barbosa
(1902-1971)
in "Líricas Portuguesas" 3ª série de Novembro de 1958.
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