quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Miguel Torga


CEIFEIRA


Acendo a luz da coragem
E dou luz ao que pareces,
Mulher que nunca pariste!
Já que ninguém te resiste,
Que te resista a verdade.
Que seja ela a mostrar
Que lucidez pode olhar
O teu nome de alvaiade.

Tens o nome de ceifeira,
E afrontas esse nome
De sol, suor e fartura.
Sujas o chão da planura,
Só a mover a gadanha.
E a jorna de terror
Que te paga o lavrador,
É roubada, não é ganha!

Ceifas a seara humana,
E não cantas a ceifar!
Fica o restolho a chorar
Quando um resto de pragana
Te segue pelos outeiros...
Mas levas mortos contigo!!!
E enches os teus celeiros
da podridão desse trigo!!!

Miguel Torga
Chaves, 27 de Setembro de 1967
in "Diário X"

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