terça-feira, 26 de outubro de 2010

Umberto Saba


PORTO

Aqui, onde o imberbe escrivão o peso
registava, e dobrados sobre a carga
em fila indiana, os trabalhadores, suados
desciam, balouçantes
as escadas das docas, para o barco, presos
entre blasfémias e gritos, de toda a vida,
só um pensamento me era inocente.

Tentava encontrar um ângulo feliz.
Muitos, na sombra da pérgola, não tinham
a minha cidade, inquieta. Queria
isolar-me com ele, juntar
versos, obter do seu mal um bem.

Ainda espero um refúgio da tempestade.
Ei-lo: foi um milagre encontrá-lo.
Tudo, se pedir, posso ter, menos
Aquele meu coração, aquele meu ar e aquele meu tempo.

Umberto Saba
(1883-1957)
Tradução de Rafael Martins

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