XXXVII
(Prega, prega, Voz Solene!)
Homem,
preso pela sombra a todas as pedras,
preso pelos olhos a todas as aves,
preso pelo corpo a todas as raízes,
preso pela sede a todas as fontes:
Olha bem de frente para as algemas,
asas pesadas de frio,
e levanta-te a cantar.
Ah! mas não deixes que nenhum eco
enferruge os teus passos de resignação.
Nem escutes
no tinir das cadeias
sinos de céus arrastados!
Nem te cegues a inventar
nas úlceras dos espartos
sinais de começo de asas.
Que ninguém se iluda de liberdade
nem sangue de grito nos pulsos.
Levanta-te a cantar
-através de pântanos e de rochas
esburacadas de caveira...-
e leva de rastos o mundo
a que te prendem todas as grilhetas
-homem livre que caminhas
amarrado ao Carro da Morte
até o Grande Silêncio.
José Gomes Ferreira
(1900-1985)
In "Poesia-I" 5ª Edição.
Compugráfica Lisboa 1972.
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