segunda-feira, 5 de maio de 2014

PROTESTO

Desespero da vida, crime turvo
Como o de água de rio que não corre;
Traição de bicho, arrependido e curvo
Dentro da concha onde se abisma e morre.

Cegueira negra no areal batido
Por altas e divinas claridades;
Pinheiro seco no pinhal, erguido
Como fantasma vil doutras idades.

Desespero da vida! Cobardia
Do tripulante duma embarcação
Que leva sonho, céu e maresia
Nas velas, no convés e no porão!

Miguel TORGA
(1907-1995)
In "Líricas Portuguesas"
( 2ª série Selecção, prefácio e notas de Cabral do Nascimento)
Outubro de 1945.

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