COM UMA CRIANÇA NOS BRAÇOS.
Vem, através de tudo vem,
com lentos, lentos mas implacáveis passos
aquela mulher que tem
uma criança nos braços.
Vem através das páginas da história
que já não conseguimos apagar
-quem pudesse fechar a memória
e deitar a chave ao mar.
Vem, através de tudo avança.
E há pessoas que ficam ofendidas
porque aquela mulher e aquela criança
deveriam ser proibidas.
Deveriam ser mas para sê-lo
os pássaros não teriam asas
e seria preciso toneladas de gelo
para apagar biliões de brasas.
E ela vem. Como se tudo desenhasse
em lentos, lentos mas implacáveis passos
- como se de Hiroxima voltasse
com uma criança nos braços.
Sidónio Muralha (1920-1982), Poemas,
Porto, Editorial Inova Limitada, 1971
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